segunda-feira, 2 de julho de 2018

Racismo na UE: ministros do Interior assumem a política externa





"Contra todo o fascismo 365 dias por ano", foto de manifestação em Itália






Nacionalismos. Racismo e xenofobia na Europa, contra migrantes e ciganos, alimentados por forças marginais que os utilizam para aumentar o consenso e manter o poder. Por Marco Bascetta, Il Manifesto.


No meio de uma sucessão de fenómenos de barbarização, a Europa põe-se em marcha para a cimeira de 28 de junho [Conselho Europeu que se ocupará “da migração, da segurança e da defesa, e dos assuntos económicos e financeiros”, N do T]. Basta falar com alguém ao acaso para se ter uma ideia de como o ar se tornou venenoso no Velho Continente. O ministro da Justiça britânico propõe enfrentar o êxodo pós-Brexit dos trabalhadores comunitários substituindo-os com presos nacionais. A Dinamarca, que há algum tempo está na vanguarda quanto a vexames a migrantes, dispõe-se a proibir a prática da circuncisão.
A Áustria transforma a atmosfera angustiante de O Deserto dos Tártaros1 num carnaval: pomposos exercícios militares na fronteira para rechaçar uma imaginária invasão de migrantes. O ministro do Interior alemão, Horst Seehofer (CSU), durante a campanha eleitoral na sua Baviera natal, impõe de facto a Angela Merkel a blindagem das fronteiras alemãs, e esse “teto” para os requerentes de asilo que a Chancelaria sempre considerou incompatível com a natureza e os valores da Bundesrepublik2.
Um dos efeitos perversos do nacionalismo crescente em boa parte da Europa é, precisamente, que os ministros do Interior passem a encarregar-se da política externa
Salvini fecha os portos e abre a boca para proferir repetidamente ameaças e obscenidades. Esforçam-se todos para tornar o ambiente dos migrantes o mais nauseabundo possível. Um dos efeitos perversos do nacionalismo crescente em boa parte da Europa é, precisamente, que os ministros do Interior passem a encarregar-se da política externa. Estes monopolizam o debate sobre os Tratados, negoceiam com países não europeus (Líbia e Turquia em primeiro lugar), condicionam as relações entre países europeus, fragmentando-os em supostos eixos ou alianças, e impõem as suas próprias fantasias geopolíticas.
Esta é uma consequência direta do “primado” conferido ao interesse nacional, entendido sobretudo como ecrã ou proteção perante a comunidade política supranacional, e dos “outros” em geral. Tratando-se de ministros que controlam as forças da ordem, o cheiro a polícia é bastante intenso. A ideia nacional é talvez o mais clássico dos universalismos aos quais se dá a volta para transformá-los no seu contrário, neste caso, o conflito latente ou declarado entre particularidades pouco dispostas à mediação.
Além disso, a coligação ideológica entre nacionalismos encerra sempre a larva da guerra.
A União Europeia sucumbe hoje ao fogo cruzado entre o nacionalismo norte-americano de Donald Trump e os “primados nacionais” que se alojam no seu seio
A União Europeia sucumbe hoje ao fogo cruzado entre o nacionalismo norte-americano de Donald Trump e os “primados nacionais” que se alojam no seu seio, os quais, começando pelo Leste, não se limitam à rejeição dos migrantes, mas viajam para ideias de sociedade muito diferentes às que temos conhecido na Europa ocidental desde o último pós-guerra.
É necessário concentrarmo-nos sobre a natureza desta barbárie de efeitos imprevisíveis, pelo menos para entender em que contexto nos encontramos. O discurso xenófobo, e ainda mais o abertamente racista, tem algo de indomável e incontrolável. Estes discursos puseram em movimento forças políticas, marginais na maior parte dos casos, que viram, na desorientação difusa gerada pelas transformações da produção e no ataque aos salários e às condições de vida que as acompanhava, a possibilidade de canalizar o descontentamento numa direcção nacionalista e autoritária que lhes permita conquistar uma posição central.
Neste tipo de contexto, os migrantes têm sido classicamente o alvo mais à mão. Assim, numa escalada de violência não só verbal, foram-se gerando e alimentando diversas pulsões xenófobas. Não porque existisse por trás algum tipo de filosofia racial ou alguma conceção cultural identitária, mas porque se tratava da via mais simples para adquirir consenso e poder. Este princípio é aplicável a um político de longa trajetória, agora em decadência, como Horst Seehofer, assim como a aventureiros do estilo de Salvini ou do seu homólogo austríaco, Herbert Kickl. Três ministros do Interior que ambicionam o controle dos respetivos países, o qual já exercem em parte.
Mas uma vez despertado o cão raivoso do racismo, será necessário continuar a nutrir a sua fome inextinguível, arriscando-se a verem-se arrastados com ele numa rampa a que até a direita xenófoba preferiria não recorrer. Nessa situação, a discriminação–perseguição-expulsão dos migrantes converte-se numa condição inevitável do consenso. Qualquer limitação a esse respeito geraria acusações de traição. Assim, os novos “caudilhos” ver-se-ão obrigados a aumentar o seu cinismo, a sua brutalidade, a dar soluções rápidas e encenações cada vez mais grotescas. E ainda em maior medida quando as populações nacionais virem como as suas próprias condições materiais não mudam para melhor.
Uma vez despertado o cão raivoso do racismo, será necessário continuar a nutri-lo, arriscando-se a verem-se arrastados com ele numa rampa a que até a direita xenófoba preferiria não recorrer
Por outro lado, também a esquerda considerou que era necessário recuperar consensos através da intolerância para os migrantes, ainda que com tons mais hipócritas e argumentos mais complicados. Com a ideia, desmentida por qualquer experiência histórica, de que bloqueando os fluxos migratórios o racismo e a xenofobia desapareceriam de forma natural e de que assim, os “italianos”, vendo-se de novo no centro da atenção e dos cuidados do seu próprio governo, mostrariam o seu reconhecimento. Tendo ainda de autoconvencer-se de que um importante momento histórico não era mais que uma “emergência”, que podia resolver-se sentando-se numa mesa com os “presidentes de câmara do sul da Líbia”, como o ex-ministro do Interior do Partido democrático, Marco Minniti, chamou com involuntário sentido de humor aos bandos de depredadores e contrabandistas que controlam aquelas areias.
De tudo isto só se pode fazer uma previsão ameaçadora. Explicando-a com uma fórmula lógica, poder-se-ia dizer que a Europa é cada vez mais refém dos estados nacionais, dos seus vetos, da demagogia que neles impera. E os estados nacionais são, por sua vez, cada vez mais reféns e prisioneiros das suas direitas radicalizadas, dedicadas a impor um “nós” no qual afundam as contradições sociais e consolidam essa ordem hierárquica que se encontra na natureza de qualquer nacionalismo.
Artigo de Marco Bascetta, publicado em Il Manifesto(link is external), traduzido para espanhol por Pedro Castrillo para El Salto(link is external) e para português por Carlos Santos para esquerda.net

1 O Deserto dos Tártaros é um romance escrito por Dino Buzzati em 1940 (ver wikipedia(link is external)).
2 República Federal
Termos relacionados MigraçõesInternacional

Fonte: www.esquerda.net

Portugueses e espanhóis protestam contra central nuclear de Almaraz




Protesto contra a central nuclear de Almaraz, Salamanca.


Organizações ambientalistas portuguesas e espanholas participaram este sábado numa manifestação em Salamanca para pressionar o governo espanhol a fechar a central nuclear.


Os protestantes manifestaram-se contra a continuação da central nuclear de Almaraz e a abertura de uma mina de urânio em Retortillo, em Salamanca, perto da bacia do rio Douro a 40 quilómetros da fronteira. O objetivo era “dar um sinal” ao novo governo de Espanha, dias depois da tomada de posse. Aliás, o manifesto dirigia-se precisamente ao novo governo espanhol.
“Fechar Almaraz e todas as demais” foi a palavra de ordem dos manifestantes, que querem o encerramento dos sete reatores nucleares existentes em Espanha.
A licença para a construção de uma unidade para armazenamento de resíduos nucleares perto da central nuclear de Almaraz chegou a originar uma queixa do Estado português à União Europeia. A construção em questão localize-se a cerca de 100 quilómetros da fronteira com Portugal e tem levado a várias reacções negativas dos ambientalistas, incluindo do Bloco de Esquerda, presente na manifestação.
A exploração de urânio numa mina a céu aberto trará problemas como o abate de cerca de 30 mil azinheiras, o risco de contaminação atmosférica com poeiras radioativas, escorrências de materiais radioativos e a contaminação dos solos com metais pesados.
“A mudança de Governo criou uma nova expectativa”, afirma Pedro Soares, deputado do Bloco e presidente da Comissão de Ambiente da Assembleia da República, já que o encerramento das centrais nucleares espanholas faz parte do programa de governo do PSOE. “Esta mudança em Espanha permite mais confiança e mobilização e é uma janela de oportunidade para o Governo se mexer em defesa dos interesses de Portugal”, remata o deputado do Bloco.

Fonte: esquerda.net

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